terça-feira, 4 de abril de 2023

 Uma só carne – Ef 5.22-31

Introdução

Num programa de televisão no qual o homem e uma mulher que moram juntos discutiam se deviam se casar. Ele queria, ela não. “Por quê a gente não casa?”, ele perguntou. Ela explodiu e disse: “Por que a gente precisa de um pedaço de papel para amar um ao outro?”. Ou seja, ela estava afirmando que não precisava de pedaço de papel para amá-lo. E “pedaço de papel” é certidão de casamento. 


1)     Sentimentos ou casamento?

Vivemos numa sociedade secular, isto é, um mundo em que Deus não domina. Ela afirma que o amor romântico é essencial para ser ter uma vida plena, mas que ele é raramente duradouro. Para essa sociedade o casamento (compromisso) e romance (sentimentos) são essencialmente incompatíveis, de que é crível confinar as pessoas a um compromisso para o resto da vida.  


O poeta Vinicius de Moraes, em soneto da felicidade, subscreve esse pensamento: “Eu possa dizer do amor que eu tive (já não tem mais) que não seja imortal (que não dure a vida inteira), posto que é chama (desejos, sentimentos, emoções), que seja infinito enquanto dure (desejos, paixão, sejo). Aliás, Vinicius encarnou direitinho em sua vida esse poema, pois teve nove mulheres e incontáveis casos. 

Já vi alguém afirmando: “Vou me casar para ser feliz”. O amor aqui em sua essência tem a ver com sentimentalismo, emoção. Contudo, quando a Escritura fala de amor, ela o mede não pelo quanto você deseja receber, mas pelo quanto de si mesmo está disposto a entregar a alguém. Quanto você está disposto a perder por essa pessoa? De quanto de sua liberdade está disposto a abrir mão? Quanto de seu tempo, emoções e recursos (todos tão preciosos) está disposto a investir nessa pessoa?

O amor Bíblico é “eros” (desejo, prazer sexual) no casamento, aliás, um casamento sem paixão e sem desejo emocional não se coaduna com a visão Bíblica. Não somente isso, mas “phileo” que é o companheirismo, estar juntos, sonhar juntos, fazer as coisas juntos, etc. E, por fim, o “agape”, que é o amor que sela o casamento e que nos dá capacidade de amar nossas esposas como Jesus amou a sua igreja.

O rei Salomão expressou essa diferença em “Cantares de Salomão” “Beije-me o meu amado com os beijos da tua boca, pois os seus afagos são melhores do que o vinho mais nobre”. Ou, “Beija-me, pois, o seu amor é mais doce do que o vinho”. Beijo aqui em Cantares é intimidade, aliança, cumplicidade, verdade, companheirismo, luz, etc. Enquanto que vinho é diversão, irresponsabilidade, é beijar sem saber quem beijou, é impressionar, status, apartamento, bens materiais, etc. 

2)     Aliança

Na Bíblia encontramos várias alianças. Temos alianças “horizontais” que eram firmadas entre seres humanos; alianças firmadas entre amigos mais chegados como Davi e Jonatas (1 Sm 18.3; 20.16); bem como entre nações. E, temos alianças “verticais”, firmadas por Deus com indivíduos (Gn 17.2) e com famílias e povos (Ex 19.5).

No entanto, em vários sentidos, a união conjugal é singular e constitui a relação mais profunda que pode existir entre dois seres humanos. Em Éfesios 5.31, Paulo cita Genesis 2.24 sobre casamento: “Por isso o homem deixará pai e mãe e se unirá a sua mulher, e os dois serão uma só carne”. Portanto, em Genesis 2.22-25, vemos a primeira cerimonia de casamento. O texto chama esse acontecimento de “unir-se”, mas a ARC chama de “apegar-se”. É um termo hebraico que significa, literalmente, “ser colado a algo”, uma aliança, uma promessa, ou um juramento. 


Por quê afirmamos que o casamento é a relação de aliança mais profunda? Porque o casamento apresenta aspectos horizontais e verticais muito marcantes. Em Malaquias 2.14, diz-se a um homem que a esposa é “Deus tem sido testemunha entre ti e a tua companheira e a mulher da tua aliança matrimonial”. Provérbios descreve a esposa infiel que “abandona o companheiro da mocidade e se esquece da aliança que fez com o seu Deus” (Pv 2.17). Portanto, a aliança entre marido e mulher é feita diante de Deus e não apenas entre os cônjuges, mas também com Deus. Ser infiel a esposa (esposo) também é infiel para com Deus.

Em Mateus 19.3, alguns fariseus perguntam a Jesus: “É permitido ao homem divorciar-se de sua mulher por qualquer motivo?” Algumas escolas rabínicas asseveravam que o homem podia se divorciar de sua esposa por qualquer motivo. Jesus, no entanto, rejeitou essa ideia e asseverou:

 “Vocês não leram que, no princípio, o Criador ‘os fez homem e mulher’ e disse: ‘Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne’? Assim, eles já não são dois, mas sim uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, ninguém o separe".Perguntaram eles: "Então, por que Moisés mandou dar uma certidão de divórcio à mulher e mandá-la embora? "Jesus respondeu: "Moisés lhes permitiu divorciar-se de suas mulheres por causa da dureza de coração de vocês. Mas não foi assim desde o princípio. Eu lhes digo que todo aquele que se divorciar de sua mulher, exceto por imoralidade sexual, e se casar com outra mulher, estará cometendo adultério" (Mt 19.4-9).

3)     O poder da promessa

Quando casamos fizemos votos para honra, respeita, ajudar, cuidar, na alegria e na dor, na saúde e na doença, etc. Depois, colocamos alianças em nossos dedos e juramos naquele ato de sermos fieis enquanto vivermos, pois “o amor é tão forte como a morte, nem as muitas aguas conseguem apagar o amor, o rio não conseguem leva-los na correnteza” (Ct 8). 

Os votos nos impedem de fugir ao primeiro sinal de dificuldade. Dão ao amor a oportunidade de criar estabilidade para que os sentimentos de amor, sempre instáveis e frágeis nos primeiros meses e anos, possam se fortalecer e se aprofundar com o passar do tempo.

Que somos? Algumas pessoas perguntam quem são, e esperam sentimentos lhes mostrem a resposta; mas sentimentos são chamas tremulas que enfraquecem, são chamas que apagam facilmente.

Quem somos? Algumas pessoas perguntam que são, e esperam que suas realizações lhes mostrem a resposta. Mas as coisas que realizamos nunca revelam o amago do caráter.

Quem somos? Algumas pessoas perguntam que são, e esperam que visões de sua identidade lhes mostrem a resposta. Mas nas nossas visões são são capazes de nos dizer quem desejamos ser, e não quem somos de fato.

Quem somos! Somos quando prometemos, quando juramos, quando aliançamos. Nossas promessas nos conferem uma identidade estável, sem a qual é impossível manter relacionamentos estáveis. Quem não cumpre as promessas, juramentos, alianças, vivem vagando desamparados e sem rumo pelas trevas do próprio coração, solitário, presos a seus contradições e ambiguidades.

Conclusão:

Soren Kirkegaard escreve sobre possíveis perspectivas de vida: vida estética e vida ética e religiosa.

Vida estética: é a vida emocionante, sentimental, livre, sem regras. Isso significa virar as costas das expectativas da sociedade e dos vínculos comunitários. A pessoa que vive para a estética não é, de maneira alguma, senhor de si mesmo; na verdade leva uma vida acidental, levado pelos gostos, sentimentos e impulsos.

Se a esposa deixa de ter a pele e o rosto atraentes ou se o marido ganha alguns kilos, o estético começa a olhar em volta à procura de alguém mais bonito ou atraente.

Vida ética e religiosa. A única maneira de você ser verdadeiramente livre é ligar seu sentimento a uma obrigação. Apenas quando se compromete a amar por meio de ações, a cada dia, mesmo quando sentimentos e circunstancias mudam, é que você pode, de fato, ser um individuo livre, e não alguém manipulado por forças externas. 


 

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