sábado, 9 de maio de 2020


Emily: quando o mundo desaba. 


Se antes de setembro alguém me perguntasse quais eram meus motivos de gratidão, eu responderia que era grata por minha família, minha casa, meu emprego e por Deus. E ainda, pelo marido que me amava e cuidava de mim, por quatro filhos (de catorze, onze, nove e cinco anos de idade) saudáveis e alegres, por um lar que nunca imaginei ter na vida, por uma carreira profissional que me permitia trabalhar em casa, usar meu cérebro e melhorar a vida da empresa e de meus clientes, e pelo Deus que proveu tudo isso para mim, apesar de eu não merecer nada.  

Em setembro, da noite para o dia, meu marido me deixou, e aos nossos quatro filhos, por outra mulher (que também abandonou o marido e dois filhos). Eles eram nossos amigos; tínhamos passado férias juntos três vezes. Eu pensava que eles fossem nossos amigos.

Meu coração morreu dentro de mim. Isso não podia estar acontecendo. Meu marido cristão, o homem que, junto comigo, explicou aos nossos filhos que, embora o divórcio fosse uma realidade, nunca aconteceria conosco. Havíamos feito uma aliança, prometido a Deus e um ao outro que — não importa o que acontecesse — continuaríamos juntos como casal e família. Chorei e implorei a ele que não nos abandonasse, que buscaríamos a solução. 



 Não teve jeito; ele estava nos deixando. Perguntei o que ele ia dizer às crianças; ele respondeu que não sabia. Eu disse a ele: “Você não pode ir embora sem dar uma explicação a elas”. Achei que isso iria sacudi-lo; ele não conseguiria encarar os filhos preciosos e dizer que os estava abandonando... mas foi o que fez. Ele chamou as crianças, que estavam na cama, e avisou que estava saindo de casa. Elas não entenderam... Ele iria viajar a trabalho? Quando voltaria? Não, crianças, estou me mudando desta casa; não vou mais voltar. E foi embora. Ficamos destroçados. 




Depois de dois meses, meu coração continuava esmagado. Senhor Deus, esse é mesmo teu plano? Como? Sei que vais curar meu coração, sei que alguma coisa boa resultará disso tudo, mas como e por que ISSO? Sinto tua presença, sinto que as pessoas estão orando...mas o que será de nós? Nunca fiquei tão irada. Nossos filhos, coitados, estão sofrendo terrivelmente; os “desejos” do pai estão acima das “necessidades” deles. “Continuo amando meus filhos”, ele diz. É mesmo? Como você pode amá-los e magoá-los tanto assim?

Depois de quatro meses, Deus começou a me curar de um jeito que não me agradou muito. Quero justiça, mas não sou eu quem deve aplicá-la. Estou começando a tentar orar por ele... não a respeito dele. Oro para que seu coração seja curado. Para que ele volte, não para mim, mas para Deus. Tenho de prosseguir sem ele, por enquanto e talvez para sempre, mas, para ficar livre da amargura, preciso perdoá-lo. Não serei uma mulher amargurada pelo resto da vida.

Mas como fazer isso? Deus me manda orar, então eu oro. Amo meus filhos, e sempre vou amar o homem com quem me casei. Oro por um milagre — para que ele se liberte disso e encontre o caminho de volta ao lar — mas também estou prosseguindo sem ele. Planejo e tento continuar com minha vida, com tudo o que precisa ser feito do ponto de vista prático, espiritual, emocional e financeiro. Continuarei a orar por ele regularmente, continuarei a amá-lo (mas não serei um capacho). Vou ser um apoio para meus filhos e seguir o plano de Deus para nossa vida. Vou perdoar, mas não esquecer, pois se esquecer, não estarei capacitada a ajudar quem estiver passando pelo mesmo horror.

Tenho de sofrer, permitir que Deus cure a dor, e então me transforme na pessoa que ele sempre quis que eu fosse. Por algum motivo, eu me sinto animada. Não faz nenhum sentido; ficar empolgada enquanto atravesso esse pesadelo. Seis meses se passaram, minha situação piorou, mesmo assim eu me sinto
verdadeiramente abençoada.

Meu marido não voltou; continua a viver com a namorada. Ele avisou que os dois farão parte da vida dos nossos filhos, que eu preciso me acostumar e não odiá-la. Disse que, se eu for inimiga dela, seria dele também. Meus filhos continuam lutando com o impacto acusado pelo pai; estão deprimidos, furiosos, confusos e frustrados. O mais velho começou a questionar a fé; está se rebelando contra todo tipo de autoridade e descontando nos irmãos. Minha casa está à venda; venda a descoberto (venda de imóvel financiado em que o credor aceita um valor menor — a descoberto — do que o valor devido para liberar o proprietário da hipoteca), e que pode terminar em execução da hipoteca. Não tenho a mínima ideia de onde vamos morar.

Ainda assim, em meio ao turbilhão, estou conhecendo a Deus num nível diferente, vejo o Senhor trabalhar de um modo que eu só ouvia falar. Experimentar isso é simplesmente extraordinário. Eu nunca havia passado por uma tragédia; nunca precisei depender de Deus. Quer dizer, claro que eu orava e via Deus agir, mas não assim. Nunca precisei confiar em Deus, simplesmente cair em seus braços e descansar nele. Quando precisava do consolo de Deus, eu me via agarrada a Jesus, enquanto ele me abraçava. Hoje, eu me vejo completamente prostrada, enquanto ele me carrega nos braços — e isso é espetacular.

Em meio a essa situação horrível, na qual toda minha identidade e meus filhos foram atacados, eu vislumbro o que Deus está fazendo e como minha vida, nossas vidas, serão transformadas, e estou entusiasmada para ver como serei quando tudo isso acabar. É como se você estivesse numa corrida; de repente começa a chover e você encontra uma poça de lama. Não dá para contornar a poça, você tem de atravessá-la; a chuva e a lama diminuem seu ritmo; você não consegue atravessar rapidamente; é preciso se concentrar em cada passo doloroso... porém, ao mesmo tempo, alguma coisa mantém você em pé, animando-o a continuar. À distância, você vê o que parece ser uma cortina de água (como a que sai da máquina de um lava-rápido) e então ele aparece: o sol; numa visão perfeitamente clara...

Quando chegar lá, você será uma pessoa mais forte, com mais conhecimento sobre como deve correr essa carreira, e terá contentamento/paz. É verdade que estará exausta, mas também revigorada pela experiência. Mal posso esperar para colocar em prática o que Deus está me ensinando; mal posso esperar para aprender mais. Foi dessa maneira que expliquei a situação para meus filhos: todos os contos de fadas têm um acontecimento trágico, e a protagonista enfrenta a adversidade, a derrota e fica mais forte por causa dela. Deus está escrevendo nosso conto de fadas — como vocês acham que ele vai terminar? 


Fonte: Thimothy Keller

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