A essência da adoração a Deus – Salmo 50
Introdução:
O Salmo 50,
de autoria de Asafe, também traça uma nítida distinção entre o “verdadeiro” e o
“falso”. Nesse caso, o objeto de avaliação não é um título educacional, mas o
coração das pessoas que se dizem adoradores de Deus. O próprio Senhor é quem,
no salmo, os distingue e se manifesta diante da falsidade dos seguidores
nominais. O salmo parece ter sido escrito em um contexto da manutenção de uma
religião ritualista, por parte de alguns, que consideravam a forma externa do
culto como tudo que importava oferecer a Deus. Não há como negar que, guardadas
as devidas proporções, é uma situação que nos lembra o ritualismo seco e morto
dos dias do profeta Malaquias: sacrifícios oferecidos diante de Deus por
corações distantes, tanto quanto possível, do Senhor digno de todo louvor.
1) Convocação Geral.
Nesse sentido, os vv.1-6 tratam
de uma convocação geral de Israel (v.1) a fim de comparecer diante do
tribunal de Deus. O tom sério e grave com que tal convocação é feita é de
“arrepiar” e fazer temer – e tremer. Diz o v.3: “Vem o nosso Deus e
não se cala; diante dele há um fogo que consome e, ao seu redor, se abate uma
enorme tempestade”. Tanto pela figura do fogo como pela da água, a ideia é de uma
inevitável destruição para aqueles que forem apanhados por Deus. O motivo de
Deus fazer a convocação é (v.4) “para julgar o seu povo”. Quanto ao juiz
da questão (v.6), “Deus é aquele que julga”.
2) O motivo da
convocação.
Como que em uma
grande assembleia, o Senhor se pronuncia contrário àqueles que o desagradam (v.7):
“Eu testemunharei contra ti”. Nessa ação, antes que haja qualquer
mal-entendido, Deus já avisa os réus que o motivo do seu juízo não se devia à
natureza, em si, dos sacrifícios que lhe ofereciam no Templo (v.8): “Eu
não te reprovo devido aos teus sacrifícios e aos teus holocaustos”. Apesar
disso, o Senhor decreta (v.9): “Não aceitarei bezerro da tua casa, nem
bodes do teu cercado”. A pergunta natural é: se o problema não era o sacrifício
em si, tanto nas disposições técnicas como na qualidade dos animais, qual,
então, era o motivo da repreensão?
Depois de o Senhor
dizer que não precisa dos sacrifícios oferecidos a ele, no sentido de não ter
necessidades que possam ser supridas por ofertas (vv.10-13), ele, então,
toca no ponto sensível da questão: a motivação dos ofertantes. Eles
participavam dos rituais ditados pelo Senhor, mas seu coração não acolhia nem
seus ensinos, nem tampouco o amor por aquele a quem sacrificavam. A triste
situação de uma religião apenas nominal e ritualista é exposta nos vv.16,17:
“Mas Deus disse ao ímpio: que vantagem tens em repetir os meus preceitos e em
carregar a minha aliança na tua boca, quando tu odeias o ensino e lanças fora
as minhas palavras?” . Deus, que viu tais defeitos no coração dos ímpios,
deu-lhes prova, também, do conhecimento a respeito dos efeitos externos da sua
desobediência e da sua insubmissão. Deus lhes acusa de aprovar a desonestidade
e a imoralidade (v.18), de serem maldosos e trapaceiros (v.19),
de trair seus próprios irmãos (v.20) e de menosprezar a santidade do
Senhor (v.21). Eis os motivos pelos quais Deus rejeitou os ímpios e os
sacrifícios deles, a exemplo de Caim. Quando o Senhor rejeitou a oferta de
Caim, não foi pelo seu conteúdo, mas devido à maldade do ofertante. Por isso,
disse a Caim: “Se procederes bem, não é certo que serás aceito?” (Gn 4.7a)
– há quem diga que a oferta de Abel foi aceita por ser “oferta de sangue”, mas
a Bíblia não dá subsídios para tal visão extemporânea e
confere à fé de Abel o motivo pelo qual ele e sua oferta foram aceitos (Hb
11.4).
Assim como Deus
instruiu Caim sobre o modo de ser aceito, fez o mesmo aos ímpios a quem se
dirige, noSalmo 50, em tom reprobatório. Fazendo isso, aponta três
traços do culto verdadeiro.
3) Como Deus aceita
nossa adoração.
O primeiro deles é um
coração genuíno. A primeira parte do v.14 diz: “Ofereça
sacrifícios de gratidão a Deus”. Apesar
de os servos nominais do Senhor, pelo que diz o próprio texto, apresentarem a
Deus suas ofertas – aquelas que Deus passou a recusar no v.9 –,
Deus orienta o modo como deveriam ocorrer: com gratidão. Parece redundante:
“Sacrifícios de gratidão com gratidão”. Entretanto, o que Deus quer ressaltar,
por meio do salmista, é que a oferta exterior deve corresponder à devoção
interior. Nesse aspecto, a oferta deve vir de um coração genuíno e, assim,
fazer sentido e ser verdadeira. E isso vale para todas as áreas pelas quais os
cultos são prestados ao Senhor.
O segundo traço é a fidelidade
a Deus. A sequência do v.14 diz: “E mantenha os seus votos
para com o Altíssimo”. O texto não explica que votos são esses, mas, quaisquer
que fossem, com fidelidade deveriam ser cumpridos. Independente de haver votos
pessoais e pontuais, cada geração de israelitas renovava com Deus a aliança
mosaica. Ela tinha um caráter bilateral. Diferente de outras alianças, tanto
Deus como os homens se comprometiam com especificações de deveres e direitos.
Do seu lado, Deus sempre foi fiel. Da parte dos servos, a ordem é que ajam do
mesmo modo.
Finalmente, o
terceiro traço é a submissão dependente. Diferente dos homens que
desprezavam as palavras do Senhor (v.17) e, na verdade, o próprio Senhor
(v.21), o servo verdadeiro conhece sua posição e a posição de Deus.
Sabendo disso e obedecendo as orientações divinas, o v.15 revela
um dever do servo. Diz-lhe o Senhor: “E clame a mim no dia do perigo”. A
dependência demonstrada nessa atitude revela a submissão do servo ao Senhor por
saber que somente Deus tem poder para cuidar do homem que lhe pertence. E
quando isso acontece, a atitude do verdadeiro servo é assim descrita por Deus:
“Você me honrará” ou “você me glorificará”.
Tal é a distinção
entre o servo verdadeiro e o servo falso; e a distinção entre o culto
verdadeiro e o culto falso; entre aquilo que Deus aceita e aquilo que ele
rejeita. Não há espaços para demonstrações vazias. Não há lugar para
ritualismos que não refletem a adoração viva vinda do íntimo dos adoradores.
Não quando Deus conhece tudo, incluindo o coração das pessoas. Nem tampouco,
quando se sabe que ele não se comove com as aparências, mas que rejeita
abertamente a adoração falsa. Com isso em mente, inevitavelmente temos de
trabalhar os nossos corações para nos arrepender de pecados, para dedicarmos
nosso tempo e nossos esforços a Deus e para sermos autênticos quando
declararmos nossa adoração ao nosso criador e salvador. Caso contrário,
ofereceremos a Deus um culto tão inútil quanto diplomas de cem dólares que
trazem, risivelmente, o título de “doutor em divindades”.
Pr. Thomas Tronco
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