Entre obediência a Jesus e a Tempestade da vida. Mt 14.22-33
INTRODUÇÃO
Uma das maiores crises que muitos
cristãos enfrentam é conciliar a bondade de Deus com as tribulações que
enfrentamos no percurso da vida. E essa crise é geral, ela de alguma forma
atinge a cada um de nós, alguns de uma forma mais intensa, outras mais brandas,
mas todos nós a enfrentamos.
Philip Yancey em seu livro “Decepcionado
com Deus” escreve: “Descobri que para muitas pessoas existe um grande abismo
entre o que esperam de sua fé cristã e o que de fato acontece. A partir de um
verdadeiro mundo de livros, sermões e testemunhos, todos prometendo vitória e
sucesso, elas aprendem a esperar que Deus atue de modo impressionante em suas
vidas. Se não enxergam tais intervenções, sentem-se desapontadas, traídas e
frequentemente culpadas. Como disse uma mulher:
Eu ficava pensando na frase
‘relacionamento pessoal com Jesus Cristo’. Mas, para minha surpresa, descobri
que isso é diferente de qualquer outro relacionamento pessoal. Nunca vi a Deus,
nunca o ouvi, nunca o senti, nunca experimentei os elementos mais básicos de um
relacionamento. Ou existe alguma coisa errada com o que me ensinaram, ou existe
alguma coisa errada comigo”.
Muitas pessoas estão decepcionadas
com Deus por causa do tipo de evangelho que lhes têm sido apresentadas. Não um
Evangelho bíblico, mas uma mutação de filosofia com espiritismo embalada em
folhas da Bíblia. E isso não é evangelho.
Esse tipo de fé leva qualquer um a
viver totalmente decepcionado com Deus. Mas quando temos uma fé firmada em Deus
pelo o que Ele é tudo se torna diferente. Como disse D. Martyn
Lloyd-Jones: “Não devemos servir a Deus pelo o que Ele dá e faz, mas pelo o que
Ele é”. A decepção que muitos tem tido com Deus é porque inverteram essa ideia,
pois Deus não nos dá e nem faz tudo que queremos, mas supre todas as nossas
necessidades (Mt 6.31-33).
John MacArthur comentando sobre o
apóstolo Paulo diz que “Ao final de sua vida, assentado só, em um calabouço
romano, Paulo ainda podia sorrir para o futuro. Palavras de esperança invadiam
sua perspectiva, pois ele media o sucesso a partir do padrão celestial”. Essa é
a diferença entre o apóstolo Paulo e os falsos “apóstolos” de nossos dias.
Essa é a grande diferença entre uma
fé firmada em Deus e uma fé firmada em milagres. Como disse Philip Yancey:
“Será que uma erupção de milagres sustentaria a fé? Provavelmente não; pelo
menos, não sustentaria o tipo de fé em que Deus parece estar interessado. Os
israelitas são uma grande demonstração de que os sinais só conseguem nos tornar
viciados em sinais, não em Deus”.
O verdadeiro evangelho é obediência
independentemente da situação que estamos enfrentando. Ser cristão, no
verdadeiro sentido da palavra, significa ser um seguidor incondicional de Jesus
Cristo. Somos ordenados a obedecê-lo sem questionar, e a segui-lo sem reclamar.
O texto que lemos nos diz que após a
multiplicação dos pães e dos peixes, Jesus compele seus discípulos a embarcar e
passar adiante para o outro lado do mar. A palavra “compelir” quer dizer: fazer
deslocar-se à força; empurrar, impelir. Ou seja, Jesus os obrigou a partir.
Eles não foram por livre e espontânea vontade, mas receberam uma ordem direta
de Jesus; e obedeceram.
Mas em meio a esta obediência, o mar
se agitou, pois o vento era contrário. Como podemos conciliar obediência com
ventos contrários em nossa vida? Como entender isso? Eu quero pensar com você
sobre isso dentro desse texto de Mateus, pois ele tem muito a nos ensinar sobre
este assunto.
EM PRIMEIRO LUGAR, QUEM OBEDECE A
JESUS PASSA POR TEMPESTADES (Mt 14.22-24).
A vida é feita de lutas e
dificuldades, não existe vida com Deus sem lutas, alias, o Senhor Jesus deixou
isso bem claro para os seus discípulos quando disse que no mundo eles passariam
por aflição (Jo 16.33). E outra coisa, a tempestade veio porque estavam dentro
da vontade de Deus e não como Jonas fora da vontade dEle.
Uma vez que Jesus é oniciente, ou
seja, sabe todas as coisas, Ele sabia que a tempestade estava por vir. Como
então Ele manda os seus discípulos para ao encontro desta tempestade?
1º - Ele queria os
livrar da tentação da multidão. No Evangelho de João nós encontramos a multidão
querendo coroá-lo Rei. Por isso a pressa de Jesus em despedir logo a multidão e
manda os seus discípulos embora (Jo 6.15). Se os discípulos não tivessem
partido, certamente teriam apoiado os planos da multidão, pois eles ainda não
entendiam os planos do Senhor.
2º - Porque os
discípulos estariam mais seguros no meio da tempestade e dentro da vontade do
Senhor do que em terra com as multidões e fora da vontade divina. A bonança nem
sempre é sinal de bênção. Às vezes ela pode tornar-se a nossa queda. Davi
estava em paz em seu palácio, e foi nesse momento que caiu (2Sm 11).
O centro da vontade de Deus é o lugar
mais seguro da terra, ainda que seja em meio a uma grande tempestade.
3º - Os discípulos
aprenderam muito mais através da manifestação do Senhor na tempestade do que se
ela não tivesse ocorrido. Os discípulos haviam enfrentado uma tempestade com o
Senhor no barco, agora estavam enfrentado outra com Ele fora do barco. O
cristianismo é um aprendizado diário, é a fé em prática todos os dias. João
quando narra este mesmo episódio diz que “Jesus ainda não viera ter com eles”
(Jo 6.17). Ainda é uma palavra que gera esperança. Não é o fim de tudo. Jesus
está a caminho. Ele ainda não chegou, mas vai logo chegar.
4º - Porque os
discípulos precisavam ter discernimento espiritual (Mt 14.25,26). Uma das
coisas mais urgentes hoje no seio da igreja é o discernimento espiritual.
Quantas pessoas sendo enganadas pelos falsos profetas por falta de
discernimento. Veem Jesus onde Ele não está e onde Ele está não o veem.
Observe que os discípulos ao verem
Jesus andando sobre o mar pensaram ser um fantasma. Eles não conseguiram
identificá-lo, mas isso tem ocorrido também hoje. Quantas pessoas que estão
vendo “fantasma” quando na verdade é o Senhor vindo ao seu encontro. Não
discernem o Senhor de um espírito maligno. E quem não tem discernimento acaba
metendo os pés pelas mãos. Veja o que em Marcos 6.48 nos diz:
“E, vendo-os em dificuldade a remar,
porque o vento lhes era contrário, por volta da quarta vigília da noite, veio
ter com eles, andando por sobre o mar; e queria tomar-lhes a dianteira”.
Jesus queria tomar-lhes a dianteira.
Queria se identificar, mas o medo os fazia remar cada vez mais para longe. O
discernimento nos faz ver e entender as coisas espirituais como elas são, mas a
falta de discernimento nos afasta dEle.
Exemplo: A história de um homem que
estava ausente de sua aldeia com seu filho. Quando eles retornaram a sua aldeia
eles a olharam do alto de um monte e perceberam que ela havia sito atacada e
todos estavam mortos. O homem disse então:
- Ah se eu fosse Deus!
O menino então olhando para o pai
disse:
- Pai se você fosse Deus não deixaria
que isso acontecesse, não é?
- Não meu filho. Se eu fosse Deus eu
entenderia.
O medo e a fé não podem conviver no
mesmo coração, pois o medo sempre nos impede de ver a presença de Deus.
EM SEGUNDO LUGAR, QUEM OBEDECE A
JESUS QUER ESTAR COM ELE (Mt 14.28,29).
Seja em que tempo for e em toda e
qualquer situação. Quem lhe obedece tem prazer de estar com Deus. Pedro não
pensou duas vezes para estar com Jesus.
Podemos destacar três razões para
isso:
1º - Quem vive
pela fé discerne a voz do Senhor. Pedro quando ouviu a voz do mestre não pensou
duas vezes para estar com Ele, ainda que fosse sobre as águas. É preciso ter fé
para sair do barco e estar com Jesus. Assim é a fé. Ela nos impulsiona a viver
o impossível e crer no extraordinário quando discernimos a voz do nosso Senhor.
Veja por exemplo a história de Abraão quando o Senhor lhe pediu Isaque (Gn 22
conf. Hb 11.17-19). Isso é fé.
2º - Quem vive
pela fé sabe que Jesus é o socorro bem presente na tribulação – v. 30-33. Quem
obedece a Jesus, mesmo tendo uma pequena fé, vê grandes milagres. Observe que o
Senhor repreende a Pedro pela sua pequena fé. Pedro começou a afundar porque
começou a reparar na força do vento, então teve medo; preste atenção, Pedro não
submergiu ele começou a afundar e logo pede por socorro. Ele não gritou por
socorro quando já estava se afogando. Isso é uma grande lição para todos nós.
Devemos gritar por socorro enquanto
há tempo e não quando ele já se esgotou. O socorro do Senhor é bem vindo já
antes da tragédia. Depois, talvez, seja tarde.
Pedro teve uma fé vacilante, pois ele
tirou os olhos do Senhor e olhou para as circunstâncias ao redor.
O termo duvidar tem o sentido de
“mostrar-se incerto ao ter de escolher entre dois caminhos”. Pedro começou com
fé, mas terminou afundando, pois viu dois caminhos em vez de um. Se quisermos
ser vitoriosos não podemos desviar os nossos olhos do Senhor. Essa é a lição
que Pedro nos deixa. É possível andar sobre as circunstâncias adversas da vida,
se não tiramos os nossos olhos do Senhor.
3º - Quem vive
pela fé recebe o conforto e consolo de Jesus na hora da tribulação – v. 25, 27.
Em meio a todo aquele desespero o Senhor traz ao coração dos seus discípulos
conforto e consolo. Jesus veio ao encontro deles na quarta vigília da noite, ou
seja, por volta da três da manhã.
Muitas vezes, temos a impressão de
que o Senhor nos abandonou justamente no momento que mais precisamos dEle. No
momento mais difícil de nossas vidas. Essa é a impressão que temos e o diabo
gosta de botar dúvidas em nosso coração. Devemos lutar contra tais pensamentos
e nos lembrar da Palavra em que Ele nos promete estar conosco em todo o tempo.
Veja por exemplo: Is 43.2; Mt 28.20c; 2Tm 4.16-18.
Quando Jesus se aproximou disse: Sou
Eu, tende bom ânimo, não temais.
Primeiro – Jesus se apresenta
– Sou Eu para mostrar que Ele não era um fantasma.
Segundo – Jesus renova
o ânimo dos discípulos – Tende bom ânimo.
Terceiro – Jesus tira o
medo dos seus corações – Não temais.
Da mesma forma o Senhor se apresenta
a cada um de nós hoje, renovando a nossa fé e trazendo alento aos nossos
corações.
EM TERCEIRO LUGAR, QUEM OBEDECE A
JESUS O ADORA, POIS SABE QUE ELE É O VERDADEIRO DEUS (Mt 14.32, 33).
Observe que o vento só cessou quando
Jesus e Pedro entraram no barco. Mas mesmo antes a confiança e a alegria já
estavam estampadas em seus corações, pois afinal de contas o Senhor havia
chegado.
Podemos tirar três lições aqui:
1º - A experiência
de Pedro foi uma bênção não apenas para ele, mas para os demais discípulos
também. A experiência de Pedro não fortaleceu somente ele, mas serviu de
fortalecimento para os demais discípulos. Assim como nos fortalece hoje também.
Não devemos viver das experiências dos outros, mas devemos entender que as
experiências alheias é uma forma de nos consolar e nos fortalecer e, acima de
tudo, nos trazer a memória que o Senhor não mudou, mas está cuidando dos Seus
ainda hoje.
2º - Eles viram
que o Senhor era o Filho de Deus. Nenhuma experiência espiritual, nenhum
milagre alcançado que não glorifique a Deus procede dEle. Toda experiência, e
todo milagre tem que nos levar a glorificar a Deus sempre. Toda vez que Jesus
operava um milagre era para fortalecer a fé das pessoas na Pessoa dEle. Nunca
se esqueça disso.
Observe um detalhe. Esse milagre
engrandece a realeza de Jesus. Quando Pedro faz o pedido: “manda-me ir ter
contigo”, usa uma palavra grega que significa “a ordem de um rei”. Pedro sabia
que Jesus Cristo era Rei sobre toda a natureza, inclusive do vento e das águas.
A palavra de Jesus é lei, e os elementos devem obedecê-lo. Por isso que Pedro
ousou sair do barco.
3º - O Senhor
sempre vem ao nosso encontro ainda que seja na quarta vigília da noite. Quem
vive pela fé em Jesus não deve se esquecer de que Ele sempre vem ao nosso
encontro, ainda que pareça tardar. O relógio de Deus não atrasa, o nosso é que
está sempre adiantado.
CONCLUSÃO
A ordem de Jesus foi cumprida pelos
seus discípulos, mas mal sabiam que aquela obediência iria lhes dar uma das
maiores experiências de suas vidas. Obedecer a Deus não é garantia de que não
enfrentaremos dificuldades na vida, mas certamente nos levará a termos
experiências grandes que fortalecerão a nossa fé no decorrer de nossa caminhada
com o Senhor.
Obedeça-O e deixe que Ele seja Senhor
em sua vida e o mais Ele fará.
Pense nisso.
***
Do blog do autor, Ministério Beréria
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