terça-feira, 27 de outubro de 2015

Carta aos exilados. Jr 29:4-14.


Introdução:  Era o ano de 587 a.C. O povo de Israel foi arrancado do lugar onde havia nascido. O exílio aconteceu em duas etapas: O rei Jeoaquim, a rainha-mãe e a grande maioria dos líderes foram deportados em 598 a.C. A maioria do povo foi deixada para trás sob o comando do rei Zedequias, apenas um rei que obedecia as ordens de Nacudonosor. Jeremias, um dos deixados para trás, escreveu a sua carta, provavelmente, em 594 a.C, onze anos depois do primeiro exílio. Os israelitas foram forçados a caminhas 1.100 quilômetros, pelo deserto do Oriente Médio, deixando para trás suas casas, templo e colinas. Na nova terra, a Babilônia, os hábitos e costumes eram muito estranhos, a língua incompreensível e a paisagem em forma de planície.  Onze anos depois do primeiro exílio, provocado por conspirações e insurreições, os exércitos da Babilônia retornaram e destruíram a cidade, em 587 a.C. 



Todos os seres humanos enfrentam exílios. Nosso primeiro exílio aconteceu quando nascemos e começamos a vida em um ambiente estranho e duro. Somos exilados novamente quando, com pouca idade, somos enviados para um mundo terrível e exigente, chamado escola. Então, enfrentamos novo exílio ao deixar a escola para dar o nosso melhor no mundo do trabalho. Somos exilados de nossa cidade natal a fim de encontrar o nosso caminho em uma nova cidade.

O significado essencial do exílio é que nós estamos onde não queríamos estar. Estamos longe de nosso lar. Somos forçados a permanecer distante de tudo o que nos é familiar.

1)    Falsos sonhos.
Jeremias e outros profetas haviam pregado que a estabilidade da nação e a segurança dependiam da fidelidade ao amor de Deus.  Mas, esta mensagem foi ridicularizada e desprezada. Um dia surgiu o exercito babilônico e capturou a cidade. Após conquistarem Jerusalém, os babilônios selecionaram os líderes da cidade para serem deportados. A tática consistia em remover todas as pessoas de influência e liderança, ou seja, artesãos, comerciantes e líderes políticos, de modo que a população ficasse dependente e submissa aos invasores. 



COMO SERÁ QUE ESTAS PESSOAS SE SENTIRAM NO EXILIO? Algo terrível nos aconteceu. E isto não é justo. Sabemos que não somos perfeitos, porém não somos piores que os demais. E, aqui acabamos nós, no deserto da Babilônia, enquanto nossos amigos desfrutam suas vidas habituais em Jerusalém. POR QUE NÓS? Não entendemos a língua, detestamos a comida, as maneiras dos babilônios são grosseiras, as escolas são precárias, não há um só lugar decente para prestar culto, as planícies são infrutíferas, o clima é insuportavelmente quente, os templos estão tomados pela imoralidade e todos falam com sotaque”.

Havia entre eles líderes religiosos que alimentavam a autopiedade do povo exilado. Conhecemos os nomes de três deles: Acabe, Zedequias e Semaías. Estes profetas chamaram a atenção para a injustiça do exílio: “Sim, é para a antiga religião de Jerusalém que devemos voltar. Sim, não é justo que permaneçamos aqui enquanto muitos estão desfrutando a boa vida em Jerusalém. Porém, tenham um pouco mais de paciência e logo estaremos de volta. Esta triste situação não deve perdurar por muito tempo. Como poderia? Nenhum de nós merece esta vida. A justiça irá prevalecer”.

Como o povo,  influenciado por esta mensagem, pensava que logo estaria voltando para sua casa, não fazia sentido entregar-se ao trabalho na Babilônia. Pregavam: Por que se esforçar plantando hortas? Era um trabalho muito duro, eles estariam longe antes do tempo da colheita. Por que aprender as práticas comerciais daquela cultura? Ou, Por que cumprir os compromissos de um casamento ou família? Os exilados, felizes por terem uma razão religiosa para serem preguiçosos, viviam apenas para comer, portando-se como parasitas na sociedade, irresponsáveis em seus relacionamentos e indiferentes à realidade de suas vidas.

2)    Uma Carta de Jeremias.
Certo dia, sem aviso, dois homens aparecerem entre os exilados, vindos de Jerusalém. Eles eram Eleasá e Gemarias. Eles chegaram em missão oficial, trazendo uma carta ao rei da Babilônia. Todos os exilados estavam atônitos. O que estava acontecendo? Eleasá e Gemarias acenaram aos exilados em completo silêncio; então revelaram que traziam uma mensagem do profeta Jeremias, uma carta aos se encontravam no exílio.

Edificai casas e habitai nelas: este é o novo lar, construam uma casa. O exílio na BabiLônia não foi sua escolha, mas é o destino que lhes foi concedido. Construam uma casa no estilo babilônio e vivam da melhor forma possível.

Plantai pomares e comei o seu fruto. Conheçam o ritmo das estações. Tornem-se parte produtiva da economia local. Coloquem as mãos na massa.

Tomais esposas e gerai filhos e filhas. Estas pessoas entre as quais estão vivendo não são inferiores nem superiores a vocês. São seus iguais e com eles vocês podem envolver-se no mais intimo e responsável dos relacionamentos. Voces não podem ser as pessoas que Deus deseja que sejam se ficarem distantes dos demais.

Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao Senhor, porque na sua paz vós tereis paz. Paz = Shalom. Esta palavra hebraica significa totalidade, a saúde dinâmica e vibrante de uma sociedade que pulsa com o propósito divinamente inspirado e move-se com amor que transforma vidas.

TOMANDO UMA DECISÃO, PORTANTO. 1) Concentrarei a minha atenção no que está errado com o mundo ao meu redor e sentirei pena de minha pobre situação? 2) Ou,  Concentrarei minhas energias para viver da melhor maneira possível no lugar em que me encontro? Sempre é muito mais fácil entregar-se a uma atitude de queixas e autopiedade do que reagir de forma positiva.

Existem dois tipos de pessoas: “As que olham para a vida e se queixam do que não possuem, e as que olham para a vida e rejubilam-se com o que possuem”.  Então a questão é esta: Viveremos com base no que possuímos ou no que não possuímos?

Conclusão: Convite a Promessa. 

“Eu sei que pensamentos tenho a vosso respeito, diz o Senhor; pensamentos de paz e não de mal, para vos dar o fim que desejais. Então, me invocareis, passareis a orar a mim, e eu vos ouvireis. Burcar-me-ei e me achareis quando me buscardes de todo o vosso coração. Serei achado de vós, diz o Senhor”. Jr 29. 11-13.

Algumas pessoas rejeitaram totalmente a mensagem. Os três profetas, por exemplo, ficaram furiosos. Semaías enviou uma contundente e agressiva carta ao sacerdote de Jerusalém, Sofonias (Jr 29:24-28). Outros porém, talvez a maioria, aceitaram de bom grado a mensagem. O resultado dessa decisão foi o surgimento de um dos mais criativos períodos de toda a história dos hebreus.

O povo no exílio aprendeu a orar de forma mais profunda e transformadora como nunca antes. Eles perderam tudo o que julgavam importante e descobriram o que, realmente, importava: descobriram o verdadeiro Deus. 

terça-feira, 20 de outubro de 2015

A machadinha de Jeremias. Jr 36



Introdução: “Se o livro que estamos lendo não nos despertar, como se uma martelo golpeasse o nosso crânio, então por que razão nós devemos Lê-lo? Um livro deve ser como uma machadinha para romper a espessa camada de gelo em nosso interior”.  Franz Kafka

1)    A machadinha de Deuteronômio.
O livro que Jeremias debruçou foi o livro de Deuteronômio. Descoberto durante os trabalhos de reparo do templo, este livro foi o manual que Josias, rei de Judá, seguiu para empreender a sua reforma. Jeremias cresceu com este livro, como Charles Spurgeon meditou mais de duzentas vezes no livro O Peregrino, meditou sobre suas palavras. Tres elementos desempenharam papel de destaque em sua leitura.

Primeiro, ao ler Deuteronômio, Jeremias adquiriu uma memória, pois este livro recapitula, na totalidade, qual o significado de pertencer ao povo de Deus. Escrito na forma de um discurso proferido por Moisés na fronteira entre o deserto e a Terra Prometida, ele revive a experiência de ser retirado do Egito, preservado no deserto e receber a promessa de uma vida plena de bênçãos.

Segundo, Jeremias adquiriu também uma base teológica. Ele aprendeu a pensar em Deus de uma forma relacional, abrangente e regular. O livro de Deuteronômio apresenta Deus em um relacionamento de amor leal e comprometido com Seu povo.

Terceiro, Jeremias tornou-se responsável em função da enorme quantidade de mandamentos presentes. O mandamento é uma palavra que nos convida a viver além do que compreendemos, sentimos ou desejamos. O mandamento eleva as pessoas da animalidade para a humanidade. A primeira palavra que Deus dirigiu a Adão foi um mandamento (Gn 1.28).

2)    A machadinha de Jeremias.
Assim como o livro de Deuteronômio recapitula a mensagem pregada por Moisés a um povo que perdeu o contato com o antigo líder, Jeremias recapitula a mensagem de Deuteronômio para um povo que estava à deriva, distante do porto original.  O rei Josias, já não estava mais presente, fora morto na batalha do Megido. O trono agora era ocupado por seu filho, Jeoaquim, que não demonstrava sinais de ter ouvido falar do livro que orientou a vida do pai. A corrupção e a falta de direção estavam de volta.

“No momento, quando é, remotamente, possível que toda uma geração tenha aprendido algo sobre a teoria e a prática, os estudiosos e seu saber foram levados pela morte, e a Igreja é confrontada com a necessidade de começar da estaca zero, novamente. Todo o esforço e trabalho de regeneração da humanidade tem de ser reiniciado a cada trinta anos ou pouco mais. Neste caso, o período foi de 17 anos”. Jeremias foi instruído (Jr 36,2-3). 



“Toma um rolo, um livro...”. A palavra está para ser escrita em um material comum, ou seja, um pergaminho ou papiro. Então, o processo é delineado: escrever desenvolve-se em escutar, que por sua vez transforma-se em mudar e, depois, em perdoar, como última etapa deste processo.

O sermão que nos levou ao arrependimento dez anos atrás, foi esquecido pela pressão dos negócios. A oração que nos encheu de renovada esperança durante um período de crise, encontra-se enterrada em uma montanha de falhas e desapontamentos.

3)    Um mundo em crise. 

Os exércitos babilônicos estavam chegando em Jerusalém, chegavam noticias que eles haviam reduzido a cidade costeira de Asquelom a ruínas. O rei estava apreensivo, o povo temia por suas vidas. Portanto, um dia de jejum foi convocado em conseqüência da crise, a cidade estava ansiosa e pessoas oravam (Jr 36.6).  O momento era perfeito. A crise havia levado as pessoas a dobrar os joelhos diante de Deus.

Jeremias fora proibido de falar em público pelo rei Jeoaquim. Mas sua mensagem estava escrita, de modo que podia ser expressa por outra pessoa. Assim, Baruque levou o rolo ao templo e o leu em voz alta diante do povo ali reunido (Jr 36.4-10). Um jovem, chamado Micaías, ouviu as palavras que Baruque lia do rolo ditado por Jeremias e tornou-se um verdadeiro ouvinte. Correu para junto do seu pai e contou-lhe todo o que havia escutado. Seu pai, com outros membros do governo, mandou chamar Baruque para que lesse o rolo diante deles, o que aconteceu pouco depois. Assim como o filho, o pai ficou impressionado; os demais ouvintes, também foram atingidos  por aquelas palavras (Jr 36.16). Portanto, eles ouviram a verdade e sentiram-se confrontados por ela. todos eram homens responsáveis e sabiam que suas vidas, bem como a vida da nação, haviam sido advertidas por esta Palavra de Deus.

Esses homens tinham consciência de que o rei precisava ser informado do ocorrido. No entanto, sabiam que no momento em que o rei ouvisse tais palavras, Jeremias e Baruque poderiam ser considerar mortos. Assim, aqueles oficiais recomendaram que os dois permanecessem em local seguro e ignorado. O rei já tinha mandado matar um profeta, Urias, que ousou enfrentá-lo (Jr 26.20-33). Com certeza, não hesitaria em matar mais um.

4)    O rolo é lançado ao fogo. 

Agora, era a hora do rei ouvir a leitura do rolo. Jeoaquim estava em sua casa de inverno, especialmente construída  para este período (era o mês de dezembro), e havia uma lareira acesa no aposento em que o rei estava, para manter o ambiente aquecido. Ele enviou um servo, Jeudi, para apanhar o rolo e Lê-lo diante dele. O rei tinha um canivete em sua mão. Quando o servo terminou de ler a terceira ou quarta folha do livro, o rei, com desdém e ar de sarcasmo, cortou o rolo com canivete, lançando-o, a seguir na lareira acesa. O rolo foi lido e destruído, coluna por coluna foi reduzida a tiras e queimada no fogo.

Conclusão: Diferenças entre Josias (pai) e Jeoaquim ( filho).

Dezessete anos antes, o pai de Jeoaquim, Josias, recebeu das mãos do escrivão Safã um rolo e ordenou que o lessem em voz alta para ele. Sua reação foi penitencial – “ele rasgou suas vestes”. Josias reconheceu aquele rolo como a Palavra do Deus verdadeiro e compreendeu a vida de pecado que todo o povo incluisive ele, na ignorância, estava vivendo. Hulda, uma profetisa, descreveu a reação de Deus ao arrependimento de Josias ( 2 Rs 22.19).

Agora, uma geração depois, a mesma cena se repete. Jeoaquim, o filho de Josias, é apresentado ao rolo pelo filho de Safã, Gemarias. A reação de Jeoaquim também foi imediata, porém o que havia em seu interior era escárnio e desprezo por aquela palavra. Ao invés de rasgar as suas vestes em sinal de arrependimento, como seu pai fizera, ele rasgou o livro, ridicularizando-o. Há uma palavra profética que termina esta narrativa, mas ao contrário das palavras de aprovação expressas por Hulda, é uma profecia sobre a condenação de Jeoaquim (Jr 36.29-30).


A palavra chave para a aprovação de Josias foi “ouviste o que falei”; a palavra chave para a condenação de Jeoaquim e sua descendência foi “não ouviram” (Jr 36.31).


terça-feira, 13 de outubro de 2015

A espiritualidade de Jeremias. Jr 15.10-21


Introdução: Sem dúvida alguma, as pessoas famosas suscitam a nossa curiosidade. Como serão elas interiormente? O que será que elas fazem quando não estão sendo observadas? O que acontece em suas vidas privadas? Com frequência, essa curiosidade tem origem em nosso desejo mesquinho de reduzir as pessoas ao nosso nível, de modo a não ficarmos embaraçados diante de nossa própria pequenez. “Se tenho que me resignar a ser um pequeno morro, espero viver num lugar totalmente plano”.

Como Jeremias era na realidade de seu intimo? O que ele fazia quando estava sozinho? Como era seu comportamento quando ninguém estava olhando? O que ele fazia quando não havia ouvintes para escutá-lo? Como ele utilizava seu tempo quando não estava envolvido em alguma confrontação com os líderes religiosos de Jerusalém? O que fazia quando não estava profetizando ao povo, confrontando os oficiais do Templo ou desafiando os religiosos?

1)    Um profeta de oração.
Resposta: ele orava. Há sete passagens no livro de Jeremias que são denominadas “confessionais” (Jr 8.18; 9.3; 11.18-23; 12.1-6; Jr 15.10-12, 15-21; 17.14-18; Jr 18.18-23; Jr 20.7-18). Em cada uma delas, o profeta fala na primeira pessoa, abrindo o seu coração. Ele revela o que está acontecendo no seu intimo enquanto os fogos de artifícios são disparados exteriormente.

Quando Jeremias encontrava-se distante dos olhos do povo, ele estava em profunda comunhão com Deus, em oração. A oração é o meio pela qual nos aproximamos de Deus, como um ser pessoal, como alguém com quem se pode conversar, não como um objeto sobre o qual falamos a respeito. “Creio que falar com Deus é sempre melhor do que falar sobre Deus; aquelas conversas piedosas. Há sempre um ar de auto-aprovação”. Orar, portanto, é dar atenção para Aquele que nos escuta e assiste. É a decisão de nos aproximarmos de Deus como pessoa central, como nosso Senhor e Salvador (Mt 6.5-6).

1.1)         A intimidade da oração.
A oração nunca ocorre na mais completa e absoluta solidão, mas na intimidade, cuidadosamente protegida e habilmente mantida. A oração é o desejo de ouvir a Deus, de falar com Ele, em primeira mão, e então, estabelecer um tempo reservado e fazer os arranjos para realizá-lo.  Quando nos aprofundamos neste texto, vemos um Jeremias assustado, solitário, ferido e irado (Jr 15.15). Uma outra tradução traz mais luz a este texto: “Por sua paciência estou sendo destruído! Considere! Por tua causa estou sofrendo abusos”.

Há um tom de desespero nesta frase. Os moinhos da ação divina giram morosamente, enquanto os motores da perseguição operam de forma frenética. Nosso tempo compulsivo colide frontalmente com o tempo da providencia divina.

1.2)         Solidão.
A seguir, Jeremias expressa a solidão que sentia: “Achadas as tuas palavras, logo as comi; as tuas palavras me foram gozo e alegria para o coração, pois pelo teu nome sou chamado, ó Senhor, Deus dos Exércitos. Nunca me assentei na roda dos que se alegram, nem me regozijei; oprimido por tua mão, eu me assentei solitário, pois já estou de posse das tuas ameaças” ( Jr 15.16,17). Primeiro, Jeremias recebeu a Palavra de Deus com desmedido entusiasmo. Deve ser uma referencia à descoberta no Templo do rolo contendo o livro de Deuteronômio, o qual Jeremias acolheu.

Segundo, era um trabalho encantador, porém solitário. Isso significa anos de solidão. A maioria das pessoas seguia o seu próprio caminho, enquanto Jeremias seguia sua solitária jornada de reflexão, de descoberta do significado da Palavra de Deus, de pregação da verdade viva.  UMA VEZ, TENDO PROVADO O GOSTO SUPREMO DA PALAVRA DE DEUS, ELE NÃO PODIA RETORNAR À INSÍPIDA DIETA DE FOFOCAS E BOATOS. ERA UMA JORNADA SEM VOLTA E SOLITÁRIA.


1.3)         Sofrimento.
Jeremias prossegue em oração, expressando todo o seu sofrimento: “Porque dura a minha dor continuamente, e a minha ferida me dói e não admite cura? (Jr 15.18).  As blasfêmias o feriam; as rebeliões provocavam-lhe hematomas. Em vão, o profeta procurava por sinais de sincera conversão.


1.4)         Ira.
A oração ganha intensidade. Agora, deixando o seu sofrimento, Jeremias, em um impulso, expressa toda a sua ira: “Seria tu para mim como ilusório ribeiro, como águas que enganam”(Jr 15.18 b). Ele chama Deus para O censurar. Como Jeremias já havia pregado que Deus era “o manancial de águas vivas” (Jr 2.13). Agora, o profeta O acusa de ser “um ribeiro ilusório, como um desses pequenos cursos d´água que, à distancia, parecem existir no deserto, mas quando se chega mais próximo de suas mensagens, descobre-se que o leito está seco.  O que Jeremias está dizendo é: “Deus, você me enganou. Voce não cumpriu as suas promessas”.


Até mesmo uma ousada acusação surgiu mais tarde, quando sua ira intensificou-se: “Persuadiste-me, ó Senhor, e persuadido fiquei; mais forte foste do que eu e prevaleceste” (Jr 20.7). Ou, em outras palavras: “Primeiro você me seduziu, depois me violentou. Voce me atraiu com palavras sedutoras, então me tomou à força e submeteu-me às suas vontades”.  Assim, era Jeremias em oração: assustado, solitário, ferido, irado.

2)    Quando Jeremias se cala, Deus fala. 

Jeremias para de falar, mas a oração prossegue, porque ela não termina quando cessamos nossa fala (Jr 15.19). Arrependimento/retorno.  Deus responde: “Eu compreendo toda a sua dor, solidão, sofrimento e ira, mas não serei indulgente com você com base nisso. Não se agarre em demasia a tais coisas. Abandone-as e arrependa-se. Se você parar com tal conversa, então Eu te restaurarei, o farei voltar ao oficio profético”.  Deus sente as nossas dores, mas Ele não é indulgente com a nossa autopiedade. Deus foi tão severo com Jeremias como este o era com o povo: “Arrependa-se. Desvie-se deste tipo de sentimentos, pois são destrutivos. Então, Eu o restaurarei, o colocarei em pé, pronto a servir novamente, em minha presença”.

A resposta de Deus prossegue: “Se apartares o precioso do vil, serás a minha boca; e eles se tornarão a ti, mas tu não passarás para o lado deles” (Jr 15.19).  Ou seja, deixa que o povo mude para o seu lado, não passe para o lado deles.  Jeremias estava preocupado com o que as pessoas estavam dizendo a seu respeito. Ele não deveria se importar com estas coisas, mas sim com Deus.  Pergunta: QUEM ESTÁ EM PRIMEIRO LUGAR AQUI? Deus ou o povo? Se Deus é quem tem a primazia, as queixas expressam apenas o que está envolvido em um trabalho difícil.

Jeremias continua a escutar e ouve estas palavras (Jr 15.20-21). Jeremias já havia ouvido estas palavras antes, em sua juventude (Jr 1.18-19). Tudo o que Deus disse Ele continuava afirmando. Não basta apenas lembrar, precisamos OUVIR novamente. A oração é o ato  no qual ouvimos de novo.  Tres verbos, de alguma forma sinônimos, concluem esta promessa: salvar, livrar e arrebatar.

Conclusão: A maratona da cidade de Boston costuma atrair os melhores maratonistas do planeta. Na primavera de 1980, Rosie Ruiz foi a primeira mulher a cruzar a linha de chegada. Ela recebeu a coroa de louros em meio a centenas de aplausos e cumprimentos. De repente, alguém reparou em suas pernas – a pele flácida e a presença de celulite. Ninguém a havia visto ao longo de todo o percurso de 42 Km. Então, a verdade apareceu: ela juntou-se aos competidores somente nos últimos 1.600 metros da prova! Assim também, tem muita gente na igreja que deseja cruzar a linha de chegada, porém sem participar de toda a prova. 




terça-feira, 6 de outubro de 2015

Jeremias  versus Pasur. Jr 20.1-6


Introdução.  O grande pintor renascentista – Leonardo da Vinci – levou anos para pintar seu quadro: “A Santa Ceia”. Em vão ele procurava um modelo apropriado para a face do Salvador. Então ele encontrou um cantor de um coral, em uma igreja, cujos traços nobres lhe chamaram a atenção. Imediatamente ele chamou o rapaz por nome Pietro Bandinelli, para posar para o quadro, e deu a Jesus a fisionomia do rapaz em seu quadro.

 Por muitos anos ele continuou pintando o seu quadro. Os discípulos estavam quase todos prontos, e só faltava o modelo para Judas Iscariotes, aquele que traiu Jesus. Da Vinci passou, então, a andar pelas ruas de Roma, procurando um rosto adequado. Finalmente achou a pessoa com o rosto certo. Era o de um sujo e esfarrapado mendigo, com uma expressão ameaçadora em seu semblante. Ele estava parado em uma esquina e logo e foi convidado para servir de modelo, o que imediatamente aceitou. 

Mas quando o pintor contemplou os traços do mendigo mais atentamente, de susto, o seu pincel lhe caiu da mão. Tratava-se do mesmo Pietro Bandinelli, cujo bonito rosto, o pintor havia usado como modelo para o rosto do Salvador. O que havia transformado o anterior rosto angelical em um rosto de bandido, de Judas? A pobreza? A fome? A doença ou coisa parecida? Não, o pecado o havia rebaixado tanto!

1)   O que vamos fazer na igreja?

Algumas pessoas vão à igreja buscando uma forma de melhorar suas vidas, para sentir-se bem consigo mesmas, para ver as coisas com maior clareza e compreensão. Outras pessoas buscam a igreja porque desejam que Deus as salve e governe suas vidas.

Um grupo de pessoas vê a igreja como uma receita rápida para um viver feliz e vitorioso; nada que interfira no sucesso ou interrompa a felicidade será tolerada. O Outro grupo enxerga a igreja como um caminho no qual as pessoas tornam-se íntegras em relação a Deus por intermédio da dor e sofrimento.  UM É O CAMINHO DE EXALTAR O QUE QUEREMOS; O OUTRO CAMINHO É COMPROMETIMENTO PESSOAL A FIM DE SE TORNAR O QUE DEUS DESEJA.

2)   Pasur – o pregador popular. 


A palavra Pasur significa “dirigente”; um alto funcionário, ou assistente direto do sumo sacerdote. Ele era um homem importante e um dos principais líderes no templo. Quando as pessoas o viam na liderança daquela prospera instituição religiosa, não podiam se sentir melhor.  Quando ele estendia suas mãos para dar a benção, todos, do mais humilde ao mais elevado, sentiam-se incluídos. Todos apreciavam ouvi-lo, pois Pasur era positivo, interessado e confiante. Ele enxergava a dimensão positiva em todas as coisas. Interpretava a presente situação de tal forma que todas as ansiedades e temores eram banidos. Pasur era um patrimônio nacional. Ele tinha uma multidão de imitadores – profetas, sacerdotes e mestres, especializados na arte de massagear a mente das pessoas.
Para Pasur “tudo irá acabar muito bem. Deus está trabalhando seus propósitos em nós. Somos o povo de Deus e ele irá abençoar todas as pessoas da terra por nosso intermédio”. Mas, esse profeta, fechava os olhos para alguns crimes ocasionais, coisas escandalosas, um crescente abismo entre pobre e rico e, muitos rituais eram ainda praticados (Jr 17.2). O que o movimento de reforma havia conseguido era manter o comportamento escandaloso fora das vistas e tornar a igreja popular novamente.

3)   Egos exaltados.

Deus primeiro fala ao profeta: Dispõe-te, e desce à casa do oleiro, e lá ouvirás as minhas palavras. Desci à casa do oleiro, e eis que ele estava entregue à sua obra sobre as rodas. Como o vaso que o oleiro fazia de barro se lhe estragou na mão, tornou a fazer dele outro vaso, segundo bem lhe pareceu. Então, veio a mim a palavra do SENHOR: Não poderei eu fazer de vós como fez este oleiro, ó casa de Israel? -diz o SENHOR; eis que, como o barro na mão do oleiro, assim sois vós na minha mão, ó casa de Israel. (18:2-6).

Mais adiante, depois que Jeremias voltou e falou ao povo e às autoridades religiosas tudo quanto da parte de Deus tinha ouvido a partir dessa situação metafórica, simbólica, que se manifestara diante dele lá na casa do oleiro, o texto diz o seguinte: Então, disseram: Vinde, e forjemos projetos contra Jeremias; porquanto não há de faltar a lei ao sacerdote, nem o conselho ao sábio, nem a palavra ao profeta; vinde, firamo-lo com a língua e não atendamos a nenhuma das suas palavras. (18:18)

Jeremias ouve isso e diz: Olha para mim, SENHOR, e ouve a voz dos que contendem comigo. (18:19). Por causa daquela postura fixa e homicida deles, vem agora esta outra palavra do Senhor: Assim diz o SENHOR a Jeremias: ”Vai, compra uma botija de oleiro!" (19:1)
  

Lembrem-se de que no primeiro caso ele vai à casa do oleiro, chega à casa do oleiro e o oleiro está trabalhando. O barro está molhado. O oleiro estava trabalhando no movimento e na dinâmica do ato de fazer um vaso; portanto, essa é uma relação viva entre o oleiro, o barro e a possibilidade de o vaso aparecer. Já nesse segundo caso, não há barro molhado, não há nada em processo, não há nenhuma matéria-prima sendo moldada na mão de Deus. Não há nenhuma matéria molhada o suficiente para aceitar os vergamentos, as flexibilizações, os moldamentos, os surgimentos do novo.

Vai agora e compra!” Já não é mais “Vai e vê!”

Já não é mais “Vai e olha como o estragado pode ser curado! Vai e vê como aquilo que por um acidente se desmantelou pode ser refeito! Vai e visita a casa de todas as possibilidades e de todas as esperanças", porque os corações dos que ouviram disseram: "Nós não queremos mudança nem que venha das mãos de Deus, e contra quem quer que fale da parte de Deus acerca disso nós tramaremos e forjaremos planos contra ele, porque agora nós é que nos tornamos senhores da lei de Deus, dos negócios de Deus, das coisas de Deus, dos mandamentos de Deus, dos ritos de Deus; ou seja, nós nos tornamos religiosos e gerentes da religião! E esse cara vem aqui, querendo introduzir, a cada dia, a possibilidade de uma mudança, de um vaso novo! Não! Nós não queremos!" O melhor barro, já que barro é barro, é barro molhado! Não existe pior barro do que barro seco! Barro botija! Barro acabado!

“Vai, portanto, e compra uma botija de oleiro, e leva contigo alguns dos anciãos do povo e dos anciãos dos sacerdotes. Sai ao vale do filho de Hinom, que está à entrada da Porta do Oleiro...” (Jr 19:1-2). Porque era um vale onde muitos reis de Israel tinham imolado seus filhos e os oferecido em sacrifício a Astarote, a Moloque, a Baal, aos deuses do imediato. E se tornara um lugar marcado por este estigma da morte. 


E aí Jeremias recebe a instrução para não ficar na Porta do Oleiro como antes, mas ir para o lado de fora, para esse vale, que, mais tarde, no Novo Testamento, passou a dar apelido simbólico àquilo que nos dias de Jesus se chamava de Inferno! Vale de Hinom, que era o lugar onde se queimava o lixo da cidade depois de um tempo. Ele ficou tão maldito que virou “lixão”! Geinom = Vale de Hinom, de onde acabou vindo a perversão, com o ganho de uma conotação à palavra que se tornou geinom, geena, inferno, na tradução. Porque era um lugar da queimação do lixo, onde o fogo não cessava, e cresceu no imaginário do povo como o lugar do inferno, geena.

No Capítulo 19, versos 10 e 11, lemos: Então, quebrarás a botija à vista dos homens que foram contigo e lhes dirás: Assim diz o SENHOR dos Exércitos: Deste modo quebrarei eu este povo e esta cidade, como se quebra o vaso do oleiro, que não pode mais refazer-se, e os enterrarão em Tofete, porque não haverá outro lugar para os enterrar.

            Dois caminhos:  Isso significa arrependimento, metanóia, mudança de mente. Significa ter, conforme Paulo diz em Romanos 12, “a mente suscetível a uma renovação contínua e constante, uma não-fixidez da mente em nenhum padrão”.

Ou sobra-nos a alternativa da falsa segurança. Da botija que diz: “Eu nasci assim, vou morrer assim, sempre ‘botijela’”. Sem transformação! 
“Meu negócio é salão de exposição! Eu quero ser vaso, mas não nas mãos do Oleiro. Eu quero ser vaso no ateliê da religião, colocado como vaso na vitrine da moral. Quero ser como vaso das aparências. Quero ser como aqueles para quem todos olham e dizem: ‘Este controla a sua própria vida’. Eu quero ser aquele ser invejável pela minha capacidade de autodeterminação e de fixação de meus próprios ideais”.
  
Conclusão:

Pasur prendeu Jeremias num tronco ao lado do norte do templo. Jeremias foi humilhado, mas não intimidado. O profeta Jeremias dirigiu palavras agudas  a Pasur como nunca antes: “O Senhor já não te chama Pasur e sim, Magor-missabibe, ou seja, Terror-Por-Todos-Os-Lados. O julgamento está próximo pela pecado intencional que campeia e tudo o que você faz é aspergir água santa sobre ele. A Babilonia invadirá este lugar, saqueará tudo e levara o povo cativo. Quando isso acontecer, Pasur, o seu nome será lembrado como Terror-Por-Todos-Os-Lados. A falsidade de sua pregação será exibida e por esta causas o julgamento é inevitável”. 

domingo, 4 de outubro de 2015

Lula: crianças naufragaram na viagem para o futuro. 



No dia 11-2-2005, o helicóptero do presidente Lula desceu na comunidade de Canaã, no agreste pernambucano, ao lado da cidade de Toritama; o presidente caminhou até um grupo de crianças e agachou-se em frente a elas. Um fotógrafo captou a cena, e a foto foi publicada nos jornais. Ao vê-la, decidi visitar as crianças e, com base no que observei, escrevi uma carta ao presidente, sob o título “Estas crianças têm nome — como dar-lhes um futuro?”.
Descrevi a realidade onde elas viviam, especialmente a escola onde estudavam, reconheci que o presidente ainda não era o culpado daquele triste cenário de penúria educacional e pobreza social, mas que seria o responsável se, dez anos depois, o quadro se mantivesse; na carta sugeri dez medidas para mudar aquela realidade, seguindo as linhas do projeto que tentei executar ao longo de 2003, quando fui ministro da Educação.
Na semana passada voltei ao local e vi a tragédia resultante de dez anos de abandono da educação e falta de políticas públicas consistentes para a emancipação dos pobres.
A menina — na foto está bem em frente ao presidente — de nome Taciana, então com 6 anos, deixou a escola aos 14, engravidou aos 15 e aos 16 tem um filho com 1 ano e dois meses, chamado Angelo Miguel. Seu irmão, conhecido como Cambiteiro, estava no grupo, mas não quis aparecer na foto. Fora da escola antes dos 15 anos, tornou-se vigilante informal nas pobres ruas de Canaã, até ser assassinado.
O menino chamado Rubinho, então com 7 anos, para quem o presidente Lula parecia olhar, deixou a escola antes da quinta série e, aos 17, tem um filho de nome Natan Rafael. Seu irmão Diego, que não aparece na foto por ser então muito pequeno, hoje com 15 anos, já esteve preso; na cadeia foi jurado de morte pelos presos, esfaqueado, fugiu do hospital e desapareceu. Jailson, o que ri para o presidente, e Josivan, na ponta direita da foto, deixaram a escola antes de terminar a quarta série. Jaques, então com 9 anos, deixou a escola com 13; o menino conhecido como Nego, então com 8 anos, não estudou e tem hoje dois filhos.
Nesses dez anos, a vida daquelas crianças tornou-se uma monótona repetição de fatos e fracassos: todas deixaram a escola antes de concluir o ensino fundamental, fazem parte do exército de analfabetos funcionais que ocupa o país; todas foram trabalhar ao redor dos 15 anos, em trabalhos informais sem qualificação; tiveram filhos ainda na adolescência; nenhuma teve o futuro a que tinha direito ao nascer.
Toritama é um Mediterrâneo onde aquelas crianças naufragaram na viagem para o futuro, diante dos olhos do presidente Lula e de todos nós.
Dez anos depois carreguei nos braços Angelo Miguel, filho da Taciana, e me veio o triste sentimento de ver nele a repetição do mesmo histórico círculo vicioso que gira passando de pais para filhos, sem mudar o rumo do destino. E seria tão fácil, se garantíssemos escola com qualidade para todos de uma geração, como aquela de Canaã, dez anos atrás. Sem isto, agora é a vez de Angelo.

Cristovam Buarque é senador (PDT-DF)