A tentação de Jesus Mc 1:12-13.
A ocasião (Mc 1.12)
·
Marcos inicia,
dizendo: “E logo o Espírito o impeliu para o deserto” (1.12). Esta expressão “e
logo” kai euthys é uma das grandes palavras de Marcos. Ele a usa 41
vezes. Não houve nenhum intervalo entre a glória do batismo de Cristo e a
dureza da sua tentação. Jesus vai repentinamente do sorriso aprovador do Pai
para as ciladas do maligno. Jesus saiu da água do batismo para o fogo da
tentação. Jesus passou imediatamente da glória do batismo à prova da tentação.
Consagração e provação foram os dois elementos da inauguração do ministério de
Jesus.
·
A plenitude do
Espírito e o agrado do Pai não são garantias de uma vida fácil nem um
salvo-conduto para a comodidade. Em vez da unção do Espírito e o agrado do Pai
o levar para uma vida palaciana, O levou para o deserto da tentação. Muitas
vezes, a vontade do Espírito de Deus nos conduzirá como conduziu a Jesus, para
os lugares que nós precisamos ir, muito embora eles possam ser lugares
perigosos.
O agente (Mc 1.12)
·
O Espírito Santo
foi quem impeliu Jesus a ir ao deserto para ser tentado. Podemos substituir a
tradução “impeliu” ekbállei por: encheu-o com uma grande urgência,
moveu-o. Esta palavra é extremamente forte. Ela foi usada onze vezes por Jesus
para expelir os demônios (1.34,39).
·
O mesmo Espírito
que desceu sobre Jesus como uma pomba, agora o impele para o deserto, com o
impulso de um leão, na força das asas de uma águia para ser tentado. O
propósito dessa batalha espiritual era para que Jesus não apenas tivesse a
natureza humana, mas também a experiência humana (Hb 2:17-18).
·
É importante
observar que a iniciativa da tentação foi do próprio Deus. Não é propriamente
Satanás quem está atacando Jesus, é Jesus quem está invadindo o seu território.
Jesus é quem está empurrando as portas do inferno. Jesus está atacando o dono
da casa (3.27). O Reino de Deus não pode vir a não ser com confronto, pois não
penetra em espaço sem dono.
·
A tentação de Jesus
não procedia de dentro dele, da sua mente, mas totalmente de fora, da
insuflação de Satanás. Jesus em tudo foi semelhante a nós, exceto no pecado.
Nós somos tentados por nossa cobiça (Tg 1.14). Quando Satanás sussurra em
nossos ouvidos uma tentação, um desejo interior nos aguça a dar ouvido a essa
tentação. A cobiça, dessa forma, nos atrai e seduz e nos leva a cair na
tentação. Com Cristo não aconteceu assim, pois o incentivo interior ao mal, ou
o desejo para cooperar com a voz tentadora, não existia.
O tentador (1.13)
· Ele é um anjo caído, um ser maligno, perverso,
assassino, ladrão e mentiroso. Ele é a antiga serpente, o dragão vermelho, o
leão que ruge, o destruidor, o deus deste século, o príncipe da potestade do
ar, o espírito que atua nos filhos da desobediência. Esse ser maligno age sem
trégua procurando por todos os meios, atingir a todas as pessoas, em todos os
lugares, em todos os tempos. Seu grande alvo é perseguir o amado Filho de Deus
e sua noiva, a Igreja. Sua obsessão é frustrar o soberano propósito de Deus.
· Esse arquiinimigo foi quem tentou Adão e Eva no jardim e
os persuadiu a pecar. Foi ele quem tentou Jesus no deserto e foi derrotado. O
primeiro Adão fracassou num jardim, o último Adão triunfou no deserto.
O conteúdo
·A primeira tentação apelou para as necessidades
físicas. Jesus estava jejuando havia quarenta dias. Seu corpo estava
debilitado e a fome lhe castigava. Satanás propôs a Jesus usar seu próprio
poder para satisfazer sua necessidade, ou seja, fazer uma coisa boa, de um modo
errado: mitigar a fome atendendo a voz do diabo. Satanás pôs em dúvida a
bondade e a providência de Deus, abrindo-lhe outro caminho para atender suas
necessidades imediatas. Ele tentou a Jesus no ponto fraco, a fome e no ponto
forte, a consciência de sua filiação divina. Jesus triunfa sobre Satanás,
citando as Escrituras e dizendo que não só de pão vive o homem, mas de toda a
palavra que procede da boca do Senhor (Dt 8.3).
·A segunda tentação apelou para o orgulho espiritual.
Na primeira tentação, Satanás tentou induzir Jesus a desconfiar da providência
de Deus; na segunda, tentou levá-lo à presunção, à confiança falsa e temerária
na proteção divina. Satanás tentou induzir Jesus a pular do pináculo do templo
para ser sustentado pelos anjos. Satanás torceu o sentido do texto bíblico e
omitiu outra parte. Ele usou a Bíblia para tentar a Jesus.
·A terceira tentação apelou para a ambição e o amor ao
poder. Satanás percebeu que Jesus estava focado no Reino de Deus. Então,
lhe ofereceu um reino sem cruz, desde que Jesus o adorasse. Jesus rebateu-o
fortemente, empunhando a adaga do Espírito, citando as Escrituras, dizendo que
só Deus é digno de ser adorado.
O propósito
Em primeiro lugar, Jesus foi tentado para provar sua
perfeita humanidade. Porque Jesus era perfeitamente homem, Ele foi
realmente tentado. Suas tentações foram reais. Ele se tornou semelhante a nós
em todas as coisas, exceto no pecado (Hb 2.17). Ele foi tentado em todas as
coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado (Hb 4.15). Jesus não foi tentado
para revelar-nos a possibilidade de pecar, mas para provar-nos sua vitória
sobre o diabo e o pecado.
Em segundo lugar, Jesus foi tentado para ser o nosso
exemplo. Jesus nos socorre em nossas fraquezas porque conhece o que
passamos e também porque venceu as mesmas tentações que nos assediam. Assim,
Ele pode compadecer-se de nós.
Em terceiro lugar, Jesus foi tentado para derrotar o
diabo. Lutamos contra um inimigo derrotado. Jesus já triunfou sobre ele. O
evangelho de Marcos apresenta o rei vitorioso sobre a natureza, o diabo, as
enfermidades e a morte. Porque Jesus venceu Satanás, podemos cantar enquanto
lutamos.
As armas da vitória
·Em primeiro lugar, a oração. A razão da vitória de
Jesus estava na sua intimidadse com o Pai. O que leva as pessoas à derrota não
é a presença do inimigo, mas a ausência de Deus. Se estamos na presença do Pai,
triunfamos sobre o inimigo. Jesus transformou o deserto da tentação em jardim
da comunhão. Quando oramos, prevalecemos.
·Em segundo lugar, o jejum. Jesus iniciou o seu
ministério terreno com quarenta dias de oração e jejum. Quem jejua tem saudade
de Deus e nele se deleita. O jejum tira os nossos olhos das outras coisas e nos
faz concentrar em Deus. O jejum transformou a aridez do deserto num jardim de
oração. Jejum é fome de Deus, é desespero por Deus. O apóstolo Paulo diz que
nós comemos e jejuamos para a glória de Deus (1Co 10.31). Charles Spurgeon diz
que os tempos mais gloriosos vividos pela sua igreja em Londres, foram nos
períodos que a igreja se dedicou aos períodos de oração e jejum.
·Em terceiro lugar, a Palavra de Deus. Jesus
triunfou sobre o diabo com a espada do Espírito, a Palavra de Deus. Ele rebateu
todas as tentações com a Palavra: Está escrito! Vivemos hoje o drama do
analfabetismo bíblico. Crentes ignorantes são presas fáceis do diabo. Vivemos
ainda o drama da substituição da Palavra pelo misticismo sincrético. Muitos
crentes estão usando armas fabricadas pelo próprio homem, armas carnais e não
aquelas que são poderosas em Deus para destruir fortalezas e anular sofismas
(2Co 10.4).
CONCLUSÃO:
A vitória sobre a tentação
A vitória de Jesus sobre a tentação revela-nos alguns
pontos importantes:
Em primeiro lugar, Jesus venceu a tentação por causa
do seu caráter santo. O príncipe deste mundo veio, mas nada tinha com ele.
Robert McCheyne diz que um homem piedoso é uma poderosa arma nas mãos de Deus.97
Em segundo lugar, Jesus venceu a tentação por uma
resoluta e determinada resistência. A Palavra de Deus ensina: “Resisti ao
diabo, e ele fugirá de vós” (Tg 4.7). Não podemos deixar brechas em nossa vida
nem abrigar pecado em nosso coração, se quisermos vencer essa batalha
espiritual.
Em terceiro lugar, Jesus venceu a tentação porque
conhecia a Palavra de Deus. Satanás venceu Eva no jardim, porque torceu a
Palavra de Deus e ela não se acautelou. Satanás citou a Bíblia para Jesus e
novamente ele torceu o texto do Salmo 91, mas Jesus o retrucou e o venceu dando
a verdadeira interpretação das Escrituras. O diabo é um mau exegeta. Ele torce
a Palavra. A Palavra de Deus na boca do diabo é palavra do diabo e não Palavra
de Deus.
Em quarto lugar, Jesus resistiu o diabo e foi servido
pelos anjos. O ministério dos anjos é algo glorioso na vida de Jesus. Eles
anunciaram o seu nascimento, serviram-no na sua tentação. Confortaram-no em sua
agonia. Os anjos serviram a Jesus do seu nascimento à sua agonia, da sua agonia
à sua ressurreição e ascensão.
Embora os evangelhos não mencionem o tipo de serviço que
foi executado pelos anjos, podemos inferir que esse serviço diekónoun
incluiria provisão para a nutrição do corpo.Adolf Pohl é mais
enfático: “Servir aqui indica trazer alimento (1.31), não ajuda na luta. É tema
para o fim do jejum. Ficamos, então, com o quadro do paraíso. Os anjos
colocaram de lado as espadas desembainhadas de Gênesis 3.24 e trazem ao novo
Adão as provisões do Pai Celestial”. J. R. Thompson diz que os
anjos serviram uma mesa para Jesus no deserto. Eles devem ter
sido os garçons de Jesus no deserto.
De acordo com Mateus 4.11, o serviço dos anjos foi
prestado a Jesus depois que o diabo foi completamente derrotado. John Henry
Burn diz que há conexão entre os três mundos: terra, céu e inferno estão mais
próximos do que imaginamos. Devemos nos regozijar na onipotência do Pai, no
socorro do Filho, na direção do Espírito e no ministério desses amigos
invisíveis (Hb 1.14) a fim de banirmos todo medo dos nossos inimigos
espirituais.
Concluindo, podemos tirar algumas lições práticas:
Em primeiro lugar, todo cristão deve esperar tempos de
prova. Deus nos prova, Satanás nos tenta. Satanás busca nos destruir, Deus
nos edificar.
Em segundo lugar, todo cristão deve estar atento aos
diversos métodos de Satanás. Satanás usou diversos estratagemas para tentar
Jesus. Devemos ficar atentos às ciladas do diabo. Ele conhece os nossos pontos
vulneráveis bem como os nossos pontos fortes. Ele explora ambos.
Em terceiro lugar, todo cristão deve acautelar-se
acerca da perseverança de Satanás. Ele tentou Jesus durante quarenta dias.
Mesmo depois de derrotado em todas as investidas, voltou com outras armas em
outras ocasiões.
Em quarto lugar, todo cristão precisa estar preparado
para os dias de provas. Jesus estava cheio do Espírito e foi guiado pelo
Espírito. Ele estava se deleitando no amor do Pai e tinha comunhão com o Pai
pela oração e jejum, mas tudo isso não o isentou da tentação.
Em quinto lugar, todo cristão deve buscar em Jesus
exemplo e socorro na hora das tentações. Jesus foi tentado em todas as
coisas, à nossa semelhança, por isso Ele pode nos entender e nos socorrer.
Em sexto lugar, todo cristão precisa compreender que
Deus não nos permite sermos provados além das nossas forças. Temos uma
gloriosa promessa em relação às tentações de toda sorte: “Não vos sobreveio
tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais
tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos
proverá livramento, de sorte que a possais suportar” (1Co 10.13).
Em sétimo lugar, todo cristão precisa resistir o
diabo. Devemos, também, seguir a orientação de Jesus: “Vigiai e orai para
que não entreis em tentação” (Mt 26.41). De semelhante modo, Tiago nos exorta:
“Resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” (Tg 4.7).
Nenhum comentário:
Postar um comentário